A partir desta quinta-feira (17), o STF (Supremo Tribunal Federal) começa a discutir um dos temas que se categorizou nos últimos anos como um dos maiores conflitos do Judiciário brasileiro: a possibilidade, ou não, de que réus condenados em segunda instância cumpram pena antes de esgotados todos os recursos.
Sobre a mesa estão três ações apresentadas com a finalidade de postergar esse cumprimento de pena para apenas depois do “trânsito em julgado”, expressão jurídica que marca o final do processo. Elas foram apresentadas pelos partidos políticos Patriota e PCdoB e pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).
Seja qual for, a decisão do STF pode afetar nada menos do que 4.895 presos no país, segundo levantamento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). O mais famoso de todos, sem dúvida, é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde 7 de abril de 2018.
Você pode me explicar melhor? O Poder Judiciário é composto por diversas instâncias. Na justiça criminal, funciona assim: um juiz decide sozinho em primeira instância. Caso a defesa ou a acusação recorram, o caso é analisado por três desembargadores, a segunda instância, que pode confirmar, reverter ou alterar a condenação.
Encerra-se neste momento a etapa de análise das provas e argumentos colocados pelas partes. Caso alguém se sinta prejudicado por algum aspecto processual, pode apresentar um “recurso especial”, julgado pela terceira instância, o STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Além disso, é possível apresentar um recurso ao STF alegando que em um caso específico há divergência sobre a interpretação da lei. É o chamado “recurso extraordinário”, que, se aceito, é julgado pela Corte para servir de referência a casos semelhantes.
O que está em julgamento. Os ministros discutirão a interpretação do trecho da Constituição que prevê que a presunção de inocência — isto é, a fé pública de que uma pessoa é inocente — deve perdurar até que haja o trânsito em julgado de uma sentença condenatória.
Para alguns ministros, isso significa que ninguém possa ser preso, portanto, até o final do processo, enquanto ainda puder recorrer da condenação. Para outros, após a sentença em segundo grau, quando o essencial sobre os fatos já foi analisado pela Justiça, é possível o cumprimento da pena, sem que se afaste o direito de que o condenado siga recorrendo.
O ex-presidente Lula foi condenado em primeira instância em julho de 2017, pelo então juiz Sergio Moro; em segunda instância em janeiro de 2018, pelo TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região); e em terceira instância pelo STJ em abril de 2019.
O petista foi considerado culpado pela posse oculta e reforma de um apartamento tríplex no Guarujá (SP), pago pela empreiteira OAS. No entendimento da Justiça, o imóvel foi reservado a Lula como forma de propina em troca de benefícios ilícitos à empresa em contratos com a Petrobras.
O que pode acontecer. Vale lembrar, mais uma vez, que não é o caso específico do ex-presidente que está em julgamento, mas sim a tese jurídica a respeito do que deve ser feito em casos como esse.
Cinco ministros defendem abertamente a manutenção da prisão em segunda instância: Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Alexandre de Moraes. Os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski são contra. As incógnitas são os votos da ministra Rosa Weber e do presidente da Corte, Dias Toffoli.
Em outros momentos, Toffoli já defendeu uma saída intermediária, com as prisões passando a acontecer a partir das condenações em terceira instância, no STJ, quando, além da análise dos fatos, também já foi feita a análise de potenciais desvios processuais.
A ministra Rosa deve engrossar o grupo contra a prisão, mas já votou a favor em diversos casos, como do que permitiu a prisão do próprio Lula 16 meses atrás. De qualquer forma, a expectativa é que o julgamento não termine nesta quinta. O tema é denso e os votos são demorados, devendo estender a discussão até a próxima semana.
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